fabulosas fábulas de iauaretê

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

FABULOSAS FÁBULAS NA USP

Iauaretê chegou aqui em casa por dois motivos: feira da USP e meu curso de pós-graduação em gestão cultural. Tenho ouvido muito sobre nossas origens afro-africanas, indígenas e o quanto elas são importantes para obter um olhar diferente da nossa história. Então, quando encontrei a Editora Peirópolis na feira anual da USP, cujos livros tem no mínimo 50% de desconto, comecei a comprar todos livros que tinham fábulas indigenas. Iauaretê foi um deles.A primeira fábula foi encantadora não só pelas possibilidades de dar ênfase em que Tupã falava como também pelo tema: uma onça cai no buraco e fica muito nervosa. E a cada nova manifestação de nervosismo, Tupã dizia CALMAAAAAAAA. Essa onça é Iauaretê e a gente não sabe até agora como ela sairá do buraco já que não lemos todas as fábulas, mas ela se acalmou porque pensou numa solução e anda dormindo pela história até agora.
Esse enredo tem me ajudado muito a conversar com a raiva da Malu. Quando ela começa com seus ataques infantis, que lembram muito a adolescente mimada que fui na TPM, eu uso "O buraco da Onça" (nome da fábula) para tentar acalmá-la. Mas não adianta falar com ela gritando...Eu a abraço e seguro ela esperneando, depois vou conversando criancês e falo: tá ouvindo Tupã falando pra o Iauretê? E aí a gente começa a falar da história.
O mais dificil foi aprender a soletrar e falar Iauaretê. Também foi o mais engraçado. A gente passa horas dando risadas repetindo I-A-U-A-RE-TÊ. Eu confesso que estou mais apaixonada por Iauaretê do que ela. A Malu se apaixonou mesmo pela Emília e a menina dos cabelos na figueira - uma das fábulas dos três volumes Histórias Brasileiras, de Ana Maria Machado (vale muito a pena comprá-lo para ler a noite para os filhos ) Mas ler Kaká Werá Jecupé ( autor do livro) é muito mais fácil que ler Monteiro Lobato para crianças de 4 a 5 anos. E o melhoros conceitos são completamente diferentes.
Enquanto a gente fica com receio de trazer á tona como Lobato caracteriza a Tia Nastácia, na fábula do encontro entre Iauretê e Kamakuã ( índia mais bela da tribo) da vontade de chorar quando ele coloca a importância da mulher ser ela mesma numa relação. Vale a pena explicar pra você entender a delícia de ler fábulas indígenas para nossos filhos.Kamakuã é uma índia que ao descobrir que Iauaretê vira onça pede ao pajé pra ser onça. Mas ela começa a fazer um monte de coisa de onça que não gosta só pra agradar Iauaretê. Resultado: a onça começa ficar mais fora de casa que dentro. Então quando Kamakuã reclama ao pajé sobre seu casamento. Ele responde: Iauaretê ainda ama muito você, mas o problema é que você deixou de ser quem é. Então, Kamakuã volta a ser índia e Iauaretê faz uma surpresa pra ela.
Resumo da ópera: leia, leia pra seu filho. Além de ser um bom ritual para a Hora do Sono tenho certeza que as fábulas servirão de bálsamo também para seu coração de mãe. Depois que li os dois volumes de Reinações de Narizinho e descobrimos as fábulas por lá, eu só tenho comprado livro de fábulas e tem sido muito gostoso aprender as morais das estórias.

domingo, 8 de novembro de 2009

Um projeto itinerante para educadores e estudantes

O escritor Kaká Werá e a Cia Duberrô circulam com o projeto “Fábulas de Iauaretê” apresentando contação de histórias, oficinas e palestra. Realizado pelo Instituto Arapoty(http://www.institutoarapoty.ning.com/), o projeto tem apoio do Governo do Estado de São Paulo, Secretaria de Estado da Cultura – Programa de Ação Cultural, patrocinio da Sorocaba Refrescos e oferece atividades gratuitas nesta quarta-feira.
Na próxima terça-feira, dia 10 de novembro, a cidade de Limeira recebe atividades do projeto “Fábulas de Iauaretê”, uma adaptação do livro de Kaká Werá, realizada pelo Instituto Arapoty e Cia Duberrô, com o patrocínio da Sorocaba Refrescos. O projeto integrou a Expo-Literária de Sorocaba e seguirá ainda por outras diversas cidades, como Tatuí, Laranjal Paulista (25/11), São Roque (05/11), Votorantim (09/11), Itapetininga (13/11) e Itapeva (16/11), contemplando uma série de atividades focadas em alunos e educadores, entre elas palestra com o escritor Kaká Werá, contação de histórias, oficinas para educadores e oficinas literárias.
O projeto foi aprovado pelo Edital ProAC (Programa de Ação Cultural) Literatura, do Governo do Estado de São Paulo, através da Secretaria de Estado da Cultura, com o objetivo de estimular a leitura de crianças e adolescentes, por meio da apresentação dos contos do livro “As Fabulosas Fábulas de Iauaretê”, do escritor Kaká Werá Jecupé (http://www.kakawera.blogspot.com/) e também através das palestras ministradas pelo escritor. Além de Kaká, “Fábulas de Iauaretê” conta com a Cia Duberrô (http://www.encantoria.com.br/), formada pela atriz Tatiana Zalla e pelos músicos Leandro Pfeifer e Domingos de Salvi, que utiliza histórias e contos de grandes escritores para dar vida às apresentações. O projeto conta ainda com a colaboração de profissionais, como Elaine Saron na direção de produção, João Jardim na concepção artística do espetáculo; Marcelo Rosenbaum na criação do cenário; Cris Rosenbaum e Lucia Muller na criação do figurino e Iago Sartini na criação do material gráfico.
Sob orientação de Kaká, a Cia Duberrô apresenta o espetáculo cênico-musical-literário “Fábulas de Iauaretê”, baseado nos contos do livro. O grupo trabalha a concepção do mesmo com cantigas, contação de histórias e se inspira em elementos da cultura popular, especialmente a cultura indígena, para a pesquisa dos fragmentos sonoros, cenário e figurinos. Por meio dessa parceria, a arte ancestral de contar e cantar histórias convida o público para apreciar os contos, uma maneira de incentivar a apreciação da leitura em geral, como forma de entretenimento, descobertas de valores, diversão, educação e reconhecimento de aspectos culturais.
As atividades acontecem nos períodos da manhã, tarde e noite. Durante o dia, foram agendadas escolas que poderão assistir a contação de histórias e, em seguida, participar das oficinas literárias ministradas pelo autor do livro, que estará presente na apresentação das 9h. Já à noite, a partir das 20h, haverá contação de histórias e uma palestra com o escritor Kaká Werá aberta e gratuíta.

O livro

Inspirado em mitos, fábulas, lendas e histórias de culturas ancestrais, nesse livro o autor transmite valores humanos de forma lúdica e bela, estimulando o imaginário dos leitores. As ilustrações do livro foram realizadas por Sawara, filha do autor, que materializou seu imaginário, ilustrando histórias que sempre ouviu. Este aspecto será utilizado nas apresentações e palestras, como estímulo à imaginação criativa revelada através da leitura, e muitas vezes, censurada pela velocidade das mídias contemporâneas.
O livro já recebeu diversos prêmios e indicações importantes, entre elas: selecionado para o Catálogo de Bolonha 2008 - FNLIJ´s selection 45ª Bologna Children's Book Fair 2008 - Categoria Reconto; selecionado para o Programa Livro Aberto da Biblioteca Nacional – 2007; selecionado para o Programa Nacional do Livro Didático - PNLD 2010 e selecionado para o Programa Mais Cultura da Biblioteca Nacional - 2008.
Sobre o autor
Kaká Werá é índio Tapuia, escritor, autor de vários livros, entre eles Ore Awé (1994 – Ed. Triom); A Terra dos Mil Povos (1998 – Ed. Peirópolis); Os Filhos da Terra (1999 – Ed. Senac); Tupã Tenondé (2000 – Ed. Peirópolis) e Iauaretê (2007 – Ed. Peirópolis). Realiza palestras há mais de 14 anos sobre seus livros em universidades, empresas, congressos e eventos em geral no Brasil e no exterior, tendo discursado como convidado na Universidade de Oxford (Inglaterra) e na Universidade de Stanford (Estados Unidos), entre outras.
Em 88 foi premiado pela Prefeitura de São Paulo com o troféu Zumbi dos Palmares. De 1989 a 1992 coordenou oficinas literárias nas Casas de Cultura de São Paulo e na Oficina Cultural Três Rios.
É professor de Educação em Valores Humanos na Fundação Peirópolis e na Unipaz (Universidade da Paz) e conferencista no Brasil e no exterior.
Kaká, através do Instituto Arapoty (fundado e coordenado pelo autor), é membro do Conselho da Bovespa Social e Ambiental, onde procura estimular o apoio a outras organizações do terceiro setor, com foco em educação e ambiente.
Sobre a Cia Duberrô
Trabalha com a arte de contar histórias através da integração das linguagens cênica, musical e literária desde 98. A Cia pesquisa e divulga a obra de grandes autores, diversidade de lendas, mitos, cantigas da cultura popular brasileira e composições próprias.
A Cia desenvolve um vasto repertório, que vai de contos tradicionais a autores contemporâneos como Rubem Alves e Kaká Werá Jecupé, sempre com a intenção de divulgar a poesia, o respeito pela natureza e os valores humanos.
É formada por uma atriz e dois músicos. Dentre vários eventos, já atuou em feiras de livro nas cidades de Londrina (PR) e Laranjal Paulista (SP), eventos no Café Filosófico – CPFL Campinas (SP), Associação Cultural Quilombo Brotas em Itatiba (SP), Festival Janeiro de Grandes Espetáculos de Recife (PE), Festival das Artes de Itu (SP), Evento Planeta Sustentável da Editora Abril no Parque do Ibirapuera e Semana da Consciência Negra no Museu da Língua Portuguesa, ambos na cidade de São Paulo.

terça-feira, 14 de julho de 2009

As Aventuras da Onça

« Juruá era um peixinho prateado que seguia um cardume igualzinho a ele. Ao mesmo tempo em que estava furioso por ter sido transformado em peixe pelo Anhangá, sentia-se maravilhado com o fundo do rio — como era lindo!
Não demorou muito e ele já sabia se comunicar na língua telepática dos peixes, e ficou curioso quando ouviu uma conversa no seu cardume:
— Lá está o boto subindo a superfície; pelo jeito, vai virar gente de novo e namorar as mulheres humanas, como ele faz toda lua cheia... »

As Aventuras da Onça
Comentários deVânia Salek



Os textos escritos hoje pelos indígenas podem ser vistos como reflexo de uma postura mais afirmativa, adotada por algumas lideranças, em relação ao que significa ser índio. Esses registros visam mostrar, dentre outras coisas, o quanto as diferentes etnias que habitavam o nosso território, bem antes do descobrimento, contribuíram para a formação da cultura brasileira. Muitos desses textos são transposições, para a língua escrita, das histórias narradas pelos mais velhos às crianças e aos jovens, há centenas de anos, com o objetivo de preservar as tradições e valores do seu povo, além de ensinar o respeito pela própria cultura e pela vida em comunidade.

O ambientalista e conferencista de origem tapuia Kaká Werá Jecupé é uma dessas lideranças e autor, entre outras obras, de As fabulosas fábulas de Iauaretê: a onça que virou guerreiro Kamaiurá, casou com Kamakuã, a bela, que gerou Iauaretê-mirim, que perseguiu o pássaro Acauã para conseguir a pena mágica e voar até Jaci-Tatá, a mulher-estrela, senhora do segredo dos poderes dos pajés. Este livro, composto de 16 histórias/capítulos, além de trazer algumas fábulas de origem indígena, já recontadas por inúmeros escritores e há muito incorporadas ao nosso patrimônio cultural, traz também as aventuras de Iauaretê-mirim, inventadas pelo autor — “de posse do jeito ancestral” —, mas com personagens já existentes: o boto, o pirarucu, o Acauã, a mulher-estrela.As histórias que falam da onça Iauaretê (que é uma das lendas do ideário guarani), de sua transformação em guerreiro, de seu casamento com Kamaiurá e do destino de seus filhos Juruá e Iauaretê-mirim apresentam certo encadeamento.
As outras, nas quais a onça aparece como personagem representando a força bruta e a estupidez – uma vez que é sempre enganada por animais mais fracos, porém mais espertos –, podem ser lidas isoladamente.
Estas histórias, que são bastante conhecidas (embora os animais variem de uma versão para outra), foram recolhidas pela primeira vez pelo General Couto de Magalhães, em 1873, e publicadas em 1874. Em viagens feitas do extremo sul ao extremo norte do Brasil, o General “descobriu que a origem dessas histórias vinha de quatro etnias distintas: os tupi, os kadiweu, os munduruku e os bororo”. Quem nos conta isso é o próprio Kaká Werá, num posfácio breve, porém interessantíssimo.
Além da presença da onça (ou de seus descendentes), as 16 histórias têm em comum a preocupação em transmitir ensinamentos, o que é um dos traços marcantes de várias culturas indígenas. Isto faz com que, algumas vezes, o texto perca em qualidade literária, como em: “Quando você se contraria, e faz coisas que não são da sua natureza, você deixa de se amar [...] Amar, minha filha, inclui cada um respeitar a natureza do outro”. Nas passagens mais descritivas, o texto apresenta qualidades poéticas, como pode ser visto em “Anhangá sumiu como um sopro veloz” ou “Era o tempo em que as flores saem das árvores e das plantas”.
Por outro lado, quando a necessidade de explicação torna-se mais importante, a poesia é prejudicada: “Já está na hora de você saber que todos nós, seres humanos, somos estrelas adormecidas dentro de um tronco de árvore, que é o nosso corpo físico”. Priorizar o lirismo subjacente às histórias, sem abandonar a forma narrativa tradicional, é o delicado equilíbrio a ser buscado pelos autores indígenas.
Um aspecto a ser questionado é o fato de o autor haver dado o nome de Iauaretê tanto à onça que virou guerreiro Kamaiurá (e personagem de conto de Guimarães Rosa), quanto à onça estúpida que é sempre lograda por outros bichos, uma vez que o único ponto em comum entre Iauaretê e o animal estúpido é o fato de ambos serem onça(s).
As ilustrações de Sawara, filha de Kaká Werá, que na ocasião tinha 11 anos de idade, têm traços característicos de desenhos infantis, feitos com lápis de cor e pastel, e geralmente mostram o que está sendo narrado. O projeto gráfico, como um todo, é cuidadoso e agradável aos olhos, e as páginas pares trazem uma vinheta lateral com desenhos de temática indígena.